a ladeira do morro da pedreira se encontrava mais lamacenta que de costume, objetos deslizavam como confetes multicolores adornando a enxurrada de barro laranja carregada de papéis, garrafas plásticas e sacos de supermercados, que terminavam por desaguar no asfalto. aquele outono de data incerta fora precedido por umas águas de março que não fechariam o verão e as estações sofreram uma estranha simbiose resultando em dias secos de noites chuvosas. Na infância nunca tivera problemas para subir o morro correndo, já que acreditava que suas pernas longas, vez e outra, manifestavam feitos mágicos, como da vez em que foi perseguido pelo dobbermann do dono do morro e saltara com pernas de joão do pulo o muro da pequena igreja pentecostal, na rua monte das oliveiras, a fim de se livrar no mínimo das mordazes mordidas caninas. não se importava com machucados e arranhões, pois embora não compreendesse o processo de cicatrização acreditara nas palavras da mãe que dizia: – “meu filho, o tempo a tudo cura”. e as memórias daqueles dias eram cristalizadas involuntariamente, tatuadas de preto na pele em carne viva, se tornando imunes às brumas elétricas do tempo. às vezes as advertências proferidas pelos lábios da mãe soavam pouco inteligíveis, eram ouvidas sem serem escutadas, e o menino bêbado de tanta água, deslizava as extremidades do guarda-chuva empenado, que rodopiava entre a palma das mãos em forma de prece, apressando o passo desengonçado que afundava, melecando a calça da escola, na ânsia de chegar em casa somente para apreciar a sinfonia que caía sobre o telhado.
quarta-feira, 27 de maio de 2009
segunda-feira, 18 de maio de 2009
poemóides
a palavra muda:
que titubeia o coração
urro inexprimível
de símbolos reticentes
perecíveis
impressas e inflamáveis
contagiosamente empoeiradas
cátedra dos cupins
sacro transgressoras
do Eu Sou
retórica de satã
projeção cega
liquefeita nos olhos
em cataratas
instante opaco
capturado e cristalizado
a dez passos da posteridade
a um passo do esquecimento
tentação indecorosa
broxantemente decadente
piranha? piranha!
dá pra quem quer tê-la
mal entoadas
melodramaticamente nasais
concluídas, inacabadas e oclusivas
átonas atônitas
grafadas em letras garrafais
gafe ágrafa
a palavra que emudece
que titubeia o coração
urro inexprimível
de símbolos reticentes
perecíveis
impressas e inflamáveis
contagiosamente empoeiradas
cátedra dos cupins
sacro transgressoras
do Eu Sou
retórica de satã
projeção cega
liquefeita nos olhos
em cataratas
instante opaco
capturado e cristalizado
a dez passos da posteridade
a um passo do esquecimento
tentação indecorosa
broxantemente decadente
piranha? piranha!
dá pra quem quer tê-la
mal entoadas
melodramaticamente nasais
concluídas, inacabadas e oclusivas
átonas atônitas
grafadas em letras garrafais
gafe ágrafa
a palavra que emudece
muda
***
sorry, narciso!
pois ai de ti
quando o tempo der contigo
a esplendidez do teu passado de glórias
não passará de esvanecidas memórias
dias cálidos, loucamente desenfreados
emurchecerão o róseo de teus lábios despetalados
pois o tempo – vil algoz – levará de ti, consigo,
da melodia da voz até os dentes do sorriso
teus olhos castanhos tornar-se-ão vermelhos
esvanecendo teu reflexo deslustrado do espelho
então o rejúbilo de teus dias findará
e teu corpo, membro por membro, adoecerá
sentirás no cerne
a horripilante putrefação da juventude
enquanto os vermes
aguardarão do teu banquete com inquietude!
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